O DIREITO À MEMÓRIA
Mais um par de décadas e poucas testemunhas do 25 de abril estarão sobreviventes. Tudo será finalmente relativizado, dirão os puristas da ciência histórica. Mas pode esquecer-se, há o risco de o tempo devorar o importante. É preciso, pois, evocar desde já o direito à memória.
No momento do 25 de abril, o panorama da ciência e do conhecimento em Portugal era confrangedor. Diz-se que a ciência servia apenas para a carreira académica – e, todavia, muitos Professores eram nomeados, quando não demitidos, de canetada pelo governo de então.
Na FEUP, em Eletrotecnia, bastava uma mão para contar pelos dedos o número de Doutorados. Havia depois um rebanho de assistentes, obrigados a serviçais, penando no seu calvário de muitos e muitos anos, pela via-sacra para o grau de Doutor. Sobrava em pose o que faltava em ligação à indústria (qual indústria?). Um laboratório de mil novecentos e carqueja era o orgulho da casa.
É preciso contar, às gerações que hoje se afligem com as dificuldades da crise e da alegada falta de perspetivas, o que aquilo era. Aquilo era o que era, não há palavras. Ou melhor: há palavras apenas para os que resistiram à resignação.
Quarenta anos volvidos, só se encontra um adjetivo: vertiginosos. O progresso atual, visto da época, é inimaginável. A recuperação que o país fez, em aquisição de conhecimento sobre a natureza e a tecnologia das coisas, era imprognosticável.
O direito à memória é que legitima o outro, o direito ao orgulho. Após o 25 de abril de setenta e quatro, gerações de portuguesas e portugueses construíram um sistema de ciência que é repositório de valor nacional e instrumento de progresso futuro. Em muitos domínios, muitos mesmo, perderam-se os complexos, que os havia e demais: a ciência portuguesa não é mais patinho feio.
No INESC TEC, celebramos desde há anos o 25 de abril no trabalho de formiguinha de cada dia. Mas é bom ter esta data, 40 anos caramba!, para parar por momentos e sorrir.
Créditos foto: http://profslusos.blogspot.pt/2012_04_01_archive.html