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A Vós a Razão

"Vou escrever sobre um tópico central a um artigo do blog “CiênciaHoje”, intitulado “Os cérebros já não fogem" (...) Como fui um dos “cérebros” que “fugiu” e estou agora com (quase) 37 anos, eis uma reflexão sobre o assunto." Rute Sofia

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"Em 2007, verde como uma alface e com vontade de mudar o mundo, cheguei a esta mui nobre instituição, para colaborar (...) num projecto que ficou conhecido internamente como o “projecto das vacas” (...) tive direito a assistir a uma ordenha às 6h da manhã, e julgo ter sido esta a primeira vez que pensei “Consultor sofre…”.." Paula Gomes

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O INESC Porto atingiu nos últimos tempos o auge do seu mediatismo... Ele é o Barack Obama que nos contrata, ele é a nossa Sónica Pinto a arrasar num jornal lido diariamente por um milhão e 14 mil pessoas. Onde iremos parar?

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Referência a anúncios publicados pelo INESC Porto, oferecendo bolsas, contratos de trabalho e outras oportunidades do mesmo género...

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A Vós a Razão

cÉREBROS nACIONAIS: A ARTE DA ESCAPADELA

Por Rute Sofia *

Pediram-me para escrever um artigo relacionado com o nosso dia-a-dia no INESC Porto, eventualmente o que estaria bem e/ou o que estaria mal. No entanto, verifiquei que já vários colegas transmitiram excelentes sugestões. A título de exemplo, sugiro uma olhadela ao artigo do “A Vós a Razão” da Teresa Andrade (UTM) em 2003 (número 21 público). Ou ao artigo por parte da Graça Barbosa (DIL) também em 2003 (número 18 público). Ou ao mais recente artigo do Filipe Magalhães (UOSE), no BIP número 92 (2009).

Vou então antes escrever sobre um tópico central a um artigo do blog “CiênciaHoje”, intitulado “Os cérebros já não fogem – Mariano Gago destaca grande capacidade competitiva na faixa dos 30 anos” (18.02.2009). Como fui um dos “cérebros” que “fugiu” e estou agora com (quase) 37 anos, eis uma reflexão sobre o assunto.  

Pertenço a uma vaga de investigadores que, durante o doutoramento, obtiveram apoio da FCT e tiveram a oportunidade de passar algum tempo (ou todo) no estrangeiro. Foram, de acordo com dados da FCT da altura, centenas de investigadores que saíram do país por diferentes períodos de tempo. Convém referir que em 1999 a maioria das empresas nacionais (grandes e médias) ainda dificilmente oferecia estágios adequados a alguém com habilitações para além da licenciatura e muito menos apoiavam este tipo de formação.

Adicionalmente, poucos eram os laboratórios ou unidades de investigação que conseguiam reter os investigadores. Tal devia-se parcialmente à falta de financiamento, mas acima de tudo devido à falta de incentivos de uma cultura de inovação para querer reter um elevado número de investigadores. Portanto, a maioria dos doutorandos que saiu do país a partir de 1999 teria entre 23-35 anos, o que significa que em média já tinha 27 anos de residência em Portugal.

Como qualquer emigrante sabe, após ter residido tanto tempo num local, mudar para outro implica um certo esforço de adaptação. Pior ainda, regressar após uma estada fora de 2-3 anos é perfeitamente possível; regressar após uma estada fora de 8-10 anos torna-se já um pouco impraticável e implica esforço de adaptação ao nosso país, como se de um país estrangeiro se tratasse. Daí muitos de nós terem optado por se manter no estrangeiro, vivendo com o sentimento ambíguo de realização profissional fora vs. realização pessoal cá dentro.

Saltando para 2009 e tendo oito anos de visão de “fora”, apenas posso dizer que o panorama de I&D mudou radicalmente e para melhor a nível de competitividade internacional. Graças a ferramentas como o Ciência (que supostamente decorre até 2013), temos excelentes oportunidades agora para manter não só alguns dos “cérebros” que não querem sair, nem sequer por um período temporário, como também capacidade para absorver outros “cérebros” que querem voltar e até colegas estrangeiros, que irão ajudar a aumentar a diversidade essencial para desenvolver inovação.

O programa Ciência permite a instituições de I&D atrair e integrar investigadores por um ciclo até cinco anos, o que supostamente é suficiente para que esses investigadores consigam gerar novas oportunidades de inovação e também sustentabilidade económica. Supostamente, porque para que tal realmente seja possível, as instituições de I&D têm de conseguir fornecer outras condições para além de financiamento directo, nomeadamente, i) um fluxo constante de mão-de-obra (alunos de mestrado e doutoramento) que permita desenvolver investigação; ii) financiamento base para desenvolvimento de actividades de disseminação científica (que funcionam como chamariz e marketing); iii) cultura de cooperação entre áreas multidisciplinares, essencial para gerar diferenciação em inovação; iv) depositar confiança e delegação de responsabilidades numa nova cultura de I&D, absorvida pelos investigadores que regressam. Actualmente, a maioria das entidades de I&D não consegue fornecer todas as condições essenciais que assegurariam a aceleração necessária a uma nova cultura de I&D.

Resumindo: o panorama nacional a nível de I&D foi radicalmente alterado num período de quase 10 anos, tendo uma aposta correcta sido feita em investimento de I&D. Nesta vaga de mudança de I&D, o Ciência surge como ferramenta fundamental de atracção em massa de investigadores por uma duração máxima de cinco anos.

No entanto, o que irá suceder por volta de 2013 se as instituições que hoje estão a absorver investigadores graças às oportunidades criadas pelo Estado não conseguirem, durante estes cinco anos, desenvolver a cultura de I&D necessária a manter os “cérebros” que captaram, nacionais e estrangeiros, que na altura terão atingido um estatuto sénior a nível de I&D?

Uma nova vaga de emigração de cérebros será nefasta para Portugal, pois poderá vir a incluir equipas inteiras de investigadores nacionais e estrangeiros, o que destruiria as oportunidades entretanto criadas. Enquanto “cérebro” que optou por voltar, cá estarei, com curiosidade, para ajudar construtivamente a encontrar e a desenvolver soluções...

 

* Colaboradora na Unidade de Telecomunicações e Multimédia (UTM)