25 ANOS DE INESC NO PORTO E A ESCOLA DE SAGRES DO FUTURO
Cumpre-se em 2010 um ciclo, 25 anos de INESC no Porto: um quarto de século.
Perdoarão os leitores, portanto, que este Editorial se alongue mais do que o costume. Mas a reflexão é pertinente: é quando celebramos o passado que mais importa ter saudades do futuro.
Que seja pois, o INESC Porto uma nova Escola de Sagres: porque navegar é preciso.
ESCOLA DE SAGRES XV
A Escola de Sagres consubstancia o mais organizado e metódico planeamento colectivo do povo português, executado ao longo de muitas décadas, com objectivos de longo prazo, e tendo como base o mais avançado conhecimento científico e tecnológico da sua época.
Escola de Sagres não é, não foi, um espaço físico. Nem local nem edifício: foi uma ideia, um projecto tenaz e consistente.
Teve um visionário na sua concepção: o Conde D. Henrique, reverenciadamente conhecido como o Infante, cujo primeiro mérito foi ter de Portugal uma ideia geoestratégica verdadeiramente planetária. Até então, pela Idade Média adiante, a visão fora sobretudo local, reino da periferia da Ibéria, entretido entre povoar e consolidar o território, acrescentando-se os Algarves, e conservar uma independência por entre os apetites de Leão e Castela.
Não faltaram os sinais de uma inquietação prévia. D. Dinis lança as bases da primeira mútua europeia de seguro, acautelando a sobrevivência dos armadores que comerciavam com Inglaterra. Fala-se da sua plantação de naus a haver. Nascem apetites sobre as Canárias.
Mas o projecto nasceu com o Infante. Note-se: para o descrever, não bastam razões simples, é necessário recorrermos a um conjunto de argumentos complexos e interdependentes, que se reforçam mutuamente e se potenciam: chegar à Índia por mar, espalhar a fé cristã, retirar o monopólio do comércio de especiarias ao eixo árabe-veneziano, ganhar conhecimento do mundo, aumentar a esfera de influência lusa contornando o bloqueio ibérico, criar um controlo marítimo atlântico, criar um império comercial, dar a Portugal importância planetária.
O genial deste plano está na definição de um objectivo concreto e material, mobilizando um esforço colectivo por persistentes décadas: descobrir o caminho marítimo para a Índia.
E o visionário da sua execução foi o recurso organizado à ciência e à técnica – o conceito de que era necessária excelência para tamanho desafio. Excelência de meios e excelência de recursos humanos. Por isso, o Infante apossou-se dos financiamentos necessários para conseguir chamar a Portugal os melhores matemáticos e cartógrafos da Europa, e para criar uma verdadeira escola de ciência náutica e astronomia que se apossasse do melhor saber da época e o multiplicasse. Com a consciência da importância do saber, declarou segredo de Estado muitas das descobertas, como se antecipasse o princípio da defesa da propriedade intelectual. Deu reforço à tecnologia, da construção naval à metalurgia. Compreendeu a importância da administração e da gestão. E assumiu a importância da iniciativa individual, ao licenciar com contratos por objectivos a exploração da costa africana.
ESCOLA DE SAGRES XXI
Eis as lições a compreender: ter um objectivo grandioso e de longo prazo, e reunir com tenacidade os meios todos de excelência necessários. Não ficar por menos. Não ser menos do que metodicamente ambicioso.
O desafio para o INESC Porto, portanto, é adquirir mensão planetária. O mundo do século XXI é mais pequeno, a globalização é a banalização, a nossa Índia é, portanto, o planeta todo.
Para isso, teremos que estabelecer a nossa própria Escola de Sagres.
E, tal como no Século XV, esse objectivo ajudará Portugal e os portugueses.
A Escola de Sagres XXI deverá assentar numa metódica política de crescimento, com criação de excelência técnica e científica por atracção de recursos humanos dos mais qualificados, vindos do mundo inteiro.
E deverá compreender que este crescimento também se tem que fazer consolidando vertentes que uma instituição menor não possui ou não tem que cuidar. A dimensão das ciências básicas tem que se aprofundar, convertendo-nos num centro de excelência mundial; a intervenção no tecido económico e industrial tem que se diversificar, convertendo-nos num pólo de projecto industrial e transferência de tecnologia.
Assim, o crescimento não se poderá fazer apenas no seguimento de uma curva natural que concorre para a saturação – terá que adoptar, sem tibiezas, o mecanismo que for indicado em cada momento, sem exclusão de nenhum: da fermentação interna de recursos à contratação externa, da criação de novas áreas à absorção de áreas externas, do robustecimento próprio ao reforço por aliança, aquisição, fusão ou outro processo.
Não há internacionalização sem presença internacional. Por isso, tal como o Infante se empenhou na instalação de feitorias, em vez de apenas mandar caravelas, também há-de chegar o momento de implantar, nos territórios convenientes à nossa navegação, os devidos entrepostos, firmando a nossa presença, para que tenhamos uma capacidade de decisão e acção local.
Também como o Infante ensinou, os recursos próprios são importantes, mas a base de apoio é fundamental. A empresa dos descobrimentos não se faria sem o poder do Reino – a empresa a que o INESC Porto deve meter os ombros também não se pode fazer alheada da sua base natural, a Universidade do Porto. Mas, para triunfar no que se propõe, não se peça que se mantenha resumido a essa dimensão. Peça-se, sim, à UP que tenha presente que o êxito do Infante redundou no êxito da sua base de apoio, Portugal.
A Escola de Sagres XXI é um projecto para o próximo Quarto de Século. É urgente começar ontem.