Offside
Fora de Série

"...o que se conseguiu só foi possível graças ao empenho e dedicação de muitos, que deram o seu melhor", António Correia Alves

A Vós a Razão

"...a minha primeira vitória: ter conseguido entrar, como bolseira de investigação, para uma grande instituição como é o INESC Porto", Ana Silva

Asneira Livre

"Uma organização não funciona sem o trabalho desempenhado pelas secretárias", Joana Dumas

Galeria do Insólito

Ainda nem foi implementado o Acordo Ortográfico em Portugal e já começam os equívocos. Pois, é que isto de siglas TMQSLD (Tem Muito Que Se Lhe Diga).

Ecografia

BIP tira Raio X a colaboradores do INESC Porto...

Jobs 4 the Boys & Girls

Referência a anúncios publicados pelo INESC Porto, oferecendo bolsas, contratos de trabalho e outras oportunidades do mesmo género...

Biptoon

Mais cenas de como bamos indo porreiros...

 

A reflexão necessária

Quem negará que o panorama da ciência em Portugal sofreu na última década e meia uma transformação radical?

A consolidação do princípio da avaliação (e da responsabilização) foi provavelmente o catalisador da mudança. Ele foi inegavelmente introduzido por uma elite política com uma visão tão excepcional como a perseverança que depois demonstrou na sua implementação.

Em paralelo, assistiu-se a uma revolução na percepção social da ciência e dos cientistas – cientista deixou de ser palavra maldita, usada por arrogantes e convencidos, para passar a ser símbolo de respeito social e ambição de actividade de muitos jovens. Os jornais passaram a ter regularmente textos, páginas, secções sobre ciência e tecnologia. As televisões dedicaram notícias, programas de divulgação científica, entrevistas, espaços temáticos sobre a ciência.

A FCT (Fundação para a Ciência e a Tecnologia) foi eixo vital dessa transformação. De mera repartição de quase empurra-papéis, a FCT passou a sentir sobre si uma exigência fortíssima e uma diversidade de funções que antes não executava. Em paralelo, os financiamentos para a Ciência incrementaram-se de forma significativa e a gestão dos programas, por via disso, complicou-se.

As circunstâncias nem sempre favoreceram, e tem que se compreender que a FCT, ela própria, precisa de uma enorme transformação de conceito e de modo de acção para poder executar, de modo eficiente, as funções que agora se exigem. Essa transformação nem sempre foi à frente das necessidades e aceita-se que, por vezes, as coisas não estejam como seria desejável que estivessem. Se em Portugal estivéssemos à espera das organizações perfeitas para só depois agir, nunca faríamos nada – nem cá, nem em parte nenhuma do mundo.

Porém, convém ter em atenção que nem tudo serve de escusa. E o ocorrido com o concurso Ciência 2008 tem que servir de exemplo e alerta, para que o sistema ganhe sensibilidade e responda com agilidade ao que a comunidade precisa – e entregue à comunidade o que lhe promete.

Opum, si malus est, nequeo laudare: não pode a obra ser elogiada se é má. Falando claro: não é bom princípio que se organize burocraticamente um processo (de complicação inútil) para contratar doutorados para as instituições e unidades de investigação – e que depois o procedimento administrativo seja completamente insensível à realidade do que é uma contratação. Lançam-se concursos internacionais, recebem-se candidaturas, espera-se que possam ser seleccionados especialistas de primeira água - e, depois, passados 8 meses da publicação dos editais, continua o processo por concluir e as desistências caem em catadupa. Pois cabe na cabeça de alguém que um candidato a um emprego fique 9 meses à espera que lhe digam se tem emprego ou não? Um candidato que, presume-se, é um especialista cobiçado pelo mercado, pode ficar tranquilamente à espera que se lhe diga uma resposta?

Esta gestão do processo não serve os interesses das instituições nem do país nem da boa aplicação do dinheiro. Fosse outro o procedimento aceite pela FCT e o INESC Porto há já cinco meses, pelo menos, teria acertado os seus contratos e dado início à colaboração dos especialistas que o Estado, em boa hora, pretende financiar para enriquecer a instituição.

Assim, continua-se à espera e os concorrentes foram desistindo entretanto. E, claro, já não se pode enviar mais convites, abrir mais editais, aproveitar mais oportunidades, porque quem pensou no processo achou que os candidatos deveriam estar formando filas, ansiosos e babando-se e esperando estoicamente pela benesse do lugar, quando a realidade é que a competição pelos recursos humanos valiosos é muito dura e a esgrima é a nível internacional. Nesta esgrima, para este caso do Ciência 2008, já perdemos.

A ideia de transformar o financiamento da contratação de doutorados para a investigação num processo na pior tradição filosófica da função pública, sem compreender o que é a dinâmica do mercado de emprego científico, foi absolutamente peregrina - e a gestão é de uma lentidão incompreensível.

Porque o papel e imagem da FCT têm que ser defendidos e preservados, não podemos crer noutro desfecho que não seja a profunda revisão do processo e extracção de lições para futuro, na sequência de um acto de auto-crítica e auscultando as unidades e as instituições do Sistema Científico nacional quanto ao que há a fazer e em que medida é que o modelo, imaginado num esconso gabinete, (não) responde à dura realidade.

Esta é uma crítica amiga. Não pretende colocar em causa a política de ciência em Portugal cuja orientação genérica tem sido muito positiva e com frutos visíveis. Mas ela é, por isso, mais urgente e necessária: e nem os nossos investigadores, nem os nossos responsáveis de unidades e de projectos compreenderiam que a sua instituição não demonstrasse que partilha com eles o sentimento de frustração - pelo desenrolar de uma medida que, à partida, inspirava outras esperanças.