INESC Porto apoia preservação de património
REABILITAÇÃO E DIFUSÃO DE HERANÇAS CULTURAIS
Imagine-se a visitar o Muro das Lamentações em Israel sem sair do lugar. Agora tente visualizar as ruínas do Parténon em Atenas ou mesmo do nosso Templo de Diana perfeitamente restauradas aos seus originais. O INESC Porto tem dado importantes passos nas áreas da reabilitação, restauro, preservação e difusão de património cultural e a prova disso é sua a participação em dois grandes projectos europeus - o MOSAICA e o H-Know.
Europa e Israel uniram-se na criação do MOSAICA, uma plataforma Web multi-cultural cujo objectivo é permitir expedições virtuais e pesquisas de conteúdos relacionados com a herança cultural judaica. Os objectivos são claros: fornecer um mosaico diversificado para um melhor conhecimento da cultura, tradição e legado judaicos, e conseguir deste modo a sua perpetuação.
Por outro lado, o crescente número de trabalhos complexos na área do restauro e manutenção de edifícios levou à necessidade da disponibilização de um acesso avançado e sistemático, por parte das empresas de construção, a conhecimento e informação relevantes na área da gestão da reabilitação, restauro e manutenção (RRM) de construções. É daqui que nasce o H-Know (Heritage-Knowledge), um projecto europeu que incide particularmente sobre a herança cultural.
Assumindo propósitos manifestamente diferentes, o MOSAICA e o H-Know têm, no entanto, ambições similares: seguindo uma estratégia colaborativa, prometem revolucionar a manutenção e difusão de heranças e patrimónios culturais de modo a garantirem a sua continuidade.
MOSAICA – Uso explorativo, guiado e colaborativo da cultura
Imagine-se a visitar a Basílica do Santo Sepulcro - onde a tradição cristã afirma que Jesus Cristo foi crucificado - em Jerusalém e a conhecer a história deste mítico local sem sequer sair do seu lugar. Esta é uma das funcionalidades ambicionadas pelo projecto recentemente terminado MOSAICA - Semantically Enhanced, Multifaceted, Collaborative Access to Cultural Heritage, que contou com a participação da Unidade de Telecomunicações e Multimédia (UTM). Este projecto oferece uma plataforma que permite a qualquer utilizador pesquisar e receber no seu computador conteúdos (vídeo, imagens, som e texto) relacionados com temas da herança cultural Judaica.
A diferença fundamental relativamente aos motores de pesquisa que normalmente usamos na Internet, como por exemplo o Google, reside na utilização de ontologias adequadas ao tipo de conteúdo que queremos encontrar, permitindo dessa forma realizar pesquisas semânticas, textuais, mais ricas do que simples pesquisas por palavra-chave. Mas para além destas capacidades avançadas de pesquisa, o MOSAICA permite criar um repositório comum com conteúdos dos próprios utilizadores, oferecendo ferramentas para anotar esses conteúdos baseadas nas referidas ontologias e ainda ferramentas para criar e explorar expedições virtuais. Uma ontologia pode ser vista como a definição formal de conceitos do mundo real e das relações que existem entre esses conceitos.
Assim, o MOSAICA, ao permitir criar histórias ou expedições virtuais à volta de um dado tema com base em conteúdos pesquisados, introduzir novas anotações semânticas e doar as expedições criadas a toda a comunidade, apresenta-se como uma plataforma explorativa e colaborativa com fins lúdicos e, ao mesmo tempo, didácticos. Como explica Teresa Andrade, investigadora da UTM e coordenadora do projecto, “fazendo uso de informação geográfica (GIS – Geographical Information System) e de tecnologias semânticas, as expedições virtuais permitem associar conteúdos relacionados com um dado tema a locais geográficos, possibilitando ao utilizador localizar geograficamente o elemento da sua pesquisa.
Com o MOSAICA é possível nomeadamente criar expedições virtuais à volta de um dado tema, como por exemplo da figura de Moisés, que evolui de uma forma geográfica (é o caso dos acontecimentos que ocorreram durante a fuga do povo judaico do Egipto para a Palestina). As anotações inseridas pelos próprios utilizadores são eventualmente sujeitas a uma auditoria por parte de um comité e disponibilizadas a toda a comunidade de utilizadores MOSAICA através do sistema de gestão e armazenamento p2p (peer-to-peer).
“O INESC Porto ficou com a responsabilidade de criar o sistema de armazenamento de conteúdos, oferecendo funcionalidades de upload e pesquisa de conteúdos aos utilizadores”, explica a investigadora. Porquê o uso das redes p2p e qual seu o maior benefício? “As redes p2p estruturadas permitem uma pesquisa mais rápida e um espaço de armazenamento distribuído por todos os utilizadores. Quantos mais utilizadores existirem numa rede p2p, mais cópias se criarão dos conteúdos pesquisados e consequentemente mais difundidos e preservados serão”, esclarece Teresa Andrade, garantindo que esta é a melhor forma de se conseguir uma “disseminação mais abrangente”.
Mas para além de dotar o MOSAICA de uma infra-estrutura p2p com as vantagens indicadas, o nosso trabalho permitiu incorporar nestas redes funcionalidades de pesquisa semântica, o que pode ser considerado com um avanço efectivo do estado da arte. As redes p2p que são actualmente usadas, não permitem efectuar pesquisa semântica, por proximidade, mas apenas uma pesquisa em que se fornece o nome do ficheiro que se pretende encontrar. Esta é efectivamente uma limitação, já que normalmente o utilizador não sabe o nome exacto do ficheiro que tem o conteúdo pretendido. Mais ainda, no caso do MOSAICA, o objectivo é encontrar e aceder a um conjunto de conteúdos que estejam relacionados entre si e não a um único ficheiro.
Na senda de um pluralismo racial, cultural e religioso
Porquê a incidência na herança cultural judaica? Em primeiro lugar, porque o MOSAICA tem como objectivo primário o combate à intolerância e ignorância entre raças, culturas e religiões. De acordo com a responsável do projecto, “uma forma de o conseguir é através da disseminação das culturas, em especial dirigida às camadas jovens e, neste contexto, o MOSAICA posiciona-se como uma ferramenta pedagógica. Mais ainda, a cultura judaica é das mais antigas e com influência e sinergias em várias religiões”.
Por outro lado, “os impulsionadores do projecto MOSAICA são Israelitas, tendo o consórcio a participação de quatro instituições deste país”, acrescenta a investigadora. O consórcio para este projecto contou com 11 parceiros vindos de Israel, Reino Unido, França, Itália, Polónia, Eslovénia e Luxemburgo, e Portugal, através do INESC Porto. A equipa portuguesa, para além de Teresa Andrade, contou ainda com Sílvio Macedo (ex-investigador do INESC Porto, agora na Xarevision), Asdrúbal Costa e Sérgio Marques.
Mas apesar da predominância na cultura judaica, o MOSAICA é um projecto multifacetado, podendo mesmo retratar obras de arte, lugares, factos da vida de personagens relevantes, descrições históricas de eventos ou mesmo músicas de diversas culturas. E de que forma este sistema se distingue, por exemplo, de uma visita ao site do Museu Louvre? Teresa Andrade exemplifica: “se estivéssemos no Louvre a apreciar o quadro da Mona Lisa, o MOSAICA, por comparação, permitir-nos-ia consultar uma biografia do Leonardo da Vinci, saber pormenores sobre o local onde a obra foi executada, detalhes de técnicas de pintura utilizadas pelo artista, informações e imagens de outras obras de da Vinci, informações sobre outros artistas que foram influenciados por este pintor, entre outras funcionalidades”.
Questionada sobre a possibilidade de aplicação deste projecto em Portugal, Teresa Andrade afirma que já foram feitos esforços nesse sentido. De facto, “apresentámos a ideia ao Museu de Serralves e ao Museu de Belmonte”, revela, acrescentando ainda que “no caso de Serralves, os primeiros beneficiados seriam alunos do ensino básico, mas também o público em geral ou em particular cidadãos de 3ª idade com mais dificuldades em se deslocarem ao próprio museu”. Em Serralves seria possível utilizar o MOSAICA para “construir expedições relacionadas com obras de arte do museu ou com as espécies de plantas existentes nos jardins do museu e assim motivar os jovens para a arte, cultura e ciência”, especifica a investigadora.
H-Know – Reabilitação, restauro e manutenção de construções
Olhando o crescente número de trabalhos complexos na área de restauro e manutenção de edifícios como um desafio, percebeu-se a necessidade de as empresas de construção conseguirem um acesso avançado e sistemático a conhecimento e informação relevantes nesta área que pudessem ser partilhados, nomeadamente no que diz respeito à gestão da Reabilitação, Restauro e Manutenção (RRM) e mesmo a tipos de materiais usados para estes trabalhos. É neste contexto que nasce o projecto H-Know (Heritage-Knowledge) - Advanced Infrastructure for Knowledge Based Services for Buildings Restoring, com a participação da Unidade de Engenharia de Sistemas de Produção (UESP).
Iniciado a 1 de Janeiro deste ano, este projecto europeu na área de construções no domínio do património cultural tem como principal objectivo o desenvolvimento de uma solução TIC que ajudará as Pequenas e Médias Empresas (PME) na área da construção, fornecendo-lhes uma plataforma colaborativa que lhes permitirá trocar conhecimentos sobre actividades de RRM e materiais promovendo, deste modo, a aprendizagem e colaboração entre parceiros.
Os serviços fornecidos pelo sistema relacionam-se com a gestão de parcerias onde se promove a partilha de conhecimento entre parceiros. De acordo com António Lucas Soares, investigador da UESP e coordenador do projecto, “este portal permitirá diversas funcionalidades que vão desde o acesso à informação partilhada por uma empresa relativamente à aplicação de um determinado material, até ao suporte e à formação de uma parceria para a elaboração de uma proposta de requalificação”.
Dirigindo-se fundamentalmente às PME do sector da construção especializadas em RRM, espera-se que os resultados deste projecto ajudem a ultrapassar um dos problemas mais importantes com que estas se deparam actualmente: a crescente complexidade dos projectos de RRM, complexidade esta que tem origem em questões técnicas, ou mesmo questões de legislação/regulação, ou de dimensão/coordenação de projectos, a que se acresce ainda o facto de haver actualmente a responsabilidade legal e social de preservar o meio ambiente.
Segundo António Lucas Soares, “isto exige, por um lado, um nível bastante elevado de cooperação materializado em estratégias, partilha de recursos e coordenação de processos”, competências nucleares da UESP, e “por outro lado, um muito maior grau de inovação em produtos e processos de RRM, potenciado em particular por uma maior troca de conhecimento entre empresas e centros de investigação”.
RRM e a importância das redes colaborativas
A contribuição específica do INESC Porto para este projecto “advém das suas competências no desenho, avaliação e gestão de redes colaborativas (sistemas de apoio à colaboração e gestão de informação) e, mais especificamente, nas áreas da sócio-semântica em redes colaborativas”, justifica o investigador, salientando a experiência de mais de 10 anos consolidada pela Unidade nesta área.
Quais são, então, as mais-valias da participação do INESC Porto num projecto como o H-Know? Para António Lucas Soares, o projecto “contribuirá seguramente para consolidar a posição do INESC Porto como especialista em redes colaborativas, em particular junto das empresas e associações do sector da construção”. Com duração de três anos e coordenação da Fundación Santa Maria La Real, o projecto inclui um consórcio composto por centros de investigação e empresas de Espanha, França, Itália e Alemanha e Portugal, que participa através da UESP com uma equipa constituída pelos investigadores António Lucas Soares, Manuel Silva, Jesse Wiersema, Pedro Castanheira, Carla Pereira e Cristóvão Sousa.
Potenciada a troca de informação e conhecimento entre empresas de construção e centros de investigação que disponibilizam o seu know-how, estão lançadas as bases para a aplicação de metodologias e de técnicas de restauro, reabilitação e manutenção de marcos históricos, um aspecto fundamental para a preservação da herança cultural. Ainda assim, “embora na designação do projecto apareça a palavra «património», o âmbito deste é maior e estende-se também a RRM de edifícios recentes”, precisa o investigador, realçando que um dos maiores desafios neste aspecto se prende com a nova legislação para a eficiência energética dos edifícios, um “factor que aumenta a complexidade destes trabalhos”.
O INESC Porto na continuidade das Heranças Culturais
Expedições virtuais e viagens interactivas por todo o mundo, restauro e reabilitação de marcos históricos. Estas são algumas das formas que temos para proteger conteúdos e heranças culturais que de outra forma o tempo poderia apagar. O INESC Porto tem dado importantes passos nas áreas da reabilitação, restauro, preservação e difusão de património cultural com a sua participação em importantes projectos cujo objectivo é reabilitar, proteger e dar a conhecer conteúdos culturais.
Projectos de âmbitos diferentes, o H-Know e o MOSAICA têm, ainda assim, ambições similares: seguindo uma estratégia colaborativa, prometem revolucionar os processos de manutenção e difusão do património tendo como objectivo primário a perpetuação das heranças e património culturais. É neste aspecto de colaboração na manutenção do património que os dois projectos se encontram. Mas mais do que isso, os projectos têm uma inegável componente social pelo impacto que causam na sociedade, potenciando um novo olhar sobre a cultura e património.