A Vós a Razão
Um projeto desafiante
Por Clara Gouveia*
Vou dedicar este espaço do BIP a um dos projetos mais desafiantes em que participei, o Laboratório de Micro-Redes e Veículos Elétricos. A construção deste laboratório foi um marco no trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pela USE, uma vez que permite validar as centenas de páginas e horas de simulação dedicadas ao desenvolvimento de soluções que permitam a integração em larga escala de fontes renováveis de energia na rede elétrica e acomodar o aumento do consumo de eletricidade originada pelos veículos elétricos.
A primeira fase do trabalho foi dedicada ao desenvolvimento e teste de protótipos de inversores que acoplam as fontes renováveis de energia (como o sol e o vento) e veículos elétricos à rede de baixa tensão. Estes protótipos distinguem-se dos produtos já existentes no mercado pelas funções de controlo que integram e que contribuem para manter a segurança de operação da rede.
Mas qual é a grande vantagem para os consumidores? Quando consideramos cenários de grande integração de microgeração, as horas de maior produção normalmente não coincidem com as horas de maior consumo, o que pode provocar o aumento de tensão na rede e a consequente saída de serviço da microgeração. Através das funções que desenvolvemos, estas unidades poderão manter-se ligadas à rede reduzindo a potência injetada na rede. A produção excedente poderá ser armazenada em baterias ou utilizada para alimentar cargas mais flexíveis como o veículo elétrico.
Por outro lado, o carregamento do veículo elétrico irá conduzir ao aumento do consumo de eletricidade. De forma a evitar investimentos avultados na infraestrutura da rede que depois se refletiriam na nossa fatura de eletricidade, o carregador desenvolvido no laboratório permite controlar o carregamento do carro e até funcionar como uma unidade de microgeração durante curtos períodos de tempo. Isto significa que acompanhado de uma camada de controlo superior poderemos carregar o veículo em períodos em que a tarifa é mais baixa ou receber um incentivo por participar em serviços da rede que habitualmente são fornecidos pelas centrais convencionais.
Os resultados até agora obtidos no laboratório são promissores, tendo despertado o interesse de diversos fabricantes. No entanto, o nosso trabalho ainda não terminou. Após o desenvolvimento de soluções de “hardware” com funções de controlo local é agora necessário desenvolver e implementar funcionalidades de gestão do consumo doméstico que poderão ser acedidas pelo consumidor através de dispositivos móveis como por exemplo o iPhone. Para além de contribuírem para a otimização do nosso consumo de eletricidade, estas aplicações poderão também funcionar como interface entre o consumidor e o operador da rede de distribuição. Complementarmente é também necessário desenvolver e implementar novos algoritmos ao nível do controlo e gestão da rede de distribuição, que permitam aos operadores gerir a rede de distribuição de forma mais inteligente, tendo em conta a flexibilidade introduzida pelos veículos elétricos e pela microgeração.
A diversidade de equipamento existente torna este laboratório único e uma infraestrutura de referência tanto a nível nacional como internacional. Embora os tempos sejam cada vez mais desfavoráveis à investigação, acredito que é possível produzirmos um trabalho científico relevante e proporcionar à indústria uma plataforma de teste privilegiada.
Assim, deixo o convite a visitarem o piso -1 do novo edifício e quem sabe possam surgir algumas colaborações no futuro. Fica aqui o “site” do laboratório, para os mais distraídos.
*Colaboradora na Unidade de Sistemas de Energia (USE)