Fluir e não engessar
Sobre o emprego científico, o que apetece escrever?
Duas coisas: 1. Que é justo e bom que se corrijam situações inaceitáveis de emprego precário através de “falsa bolsa”, com investigadores nessa posição por muitos anos, por vezes mais do que uma década; 2. Que é bom sintoma que o emprego científico aumente em Portugal, respondendo a uma procura de conhecimento e tecnologia por parte da economia, sociedade, empresas, administração.
E uma terceira: usando o ditado inglês, que não se deve deitar fora o menino com a água do banho.
A figura de bolsa, na investigação científica, como período de progresso pessoal e formação, ou como estatuto temporário de apoio económico em situações transitórias (como é o caso de visitantes oriundos de instituições terceiras) é, em todos os países desenvolvidos, uma figura útil. Corresponde a um ganha-ganha: ganha o bolseiro, porque recebe formação e avoluma o seu currículo, e ganha a instituição de acolhimento, porque o bolseiro devolve, em resultados e em participação no trabalho científico, os custos de orientação e do acolhimento.
Não como forma de emprego, mas como processo transitório de formação.
O perigo está, como em todas a coisas habituais da vida, no extremismo, na interpretação radical, de que não deve haver bolsas, de que tudo é contrato de trabalho e de que todo o vínculo deve ser sem termo. Há uma linha de separação que tem que ser assumida com frontalidade, entre a segurança e o engessamento.
Beneficiando as Unidades de Investigação e as Instituições de Ensino Superior e de I&D de um processo de apoio financeiro do Estado na mudança do paradigma, que se saúda, há que acautelar também o futuro. Por isso, há também que entender que, pela natureza própria de uma instituição de investigação, a permanente renovação de uma percentagem importante das pessoas é motor essencial da sua adaptação à inovação, e é forma muito eficaz de transportar, para a sociedade e as empresas, novos profissionais mais qualificados e novos conhecimentos.
Não há melhor transferência de tecnologia de universidades para empresas do que a que contém a transferência de pessoas.
Em certo sentido, as Unidades de Investigação devem ser, para uma quantidade enorme de pessoas, lugar por onde passar, mais do que lugar para se estar.