A Voz a Razão
O Risco do Sucesso ou o Sucesso do Risco
Por Pedro Fortuna*
Foi-me endereçado o convite para apresentar neste espaço a minha visão dos desafios que se colocam a um investigador quando este decide criar uma start-up. Para aqueles que não estejam familiarizados com o termo, uma start-up é um projecto de empresa, tipicamente de base tecnológica, que parte de uma ideia ou pouco mais do que isso.
Ter uma boa ideia é um dos ossos do ofício de quem se encontra num ambiente onde a inovação é um objectivo e onde o estímulo à criatividade é constante. O problema é que não raramente esta surge de forma acidental, um devaneio da nossa mente hiperactiva, podendo com probabilidade equivalente ao seu arrojo, ser confundida com uma contribuição humorística. Quem não ficou chocado com o tipo que fez um milhão de dólares a vender pixéis de uma vulgar página Web? Quem não pensou "como é que não me lembrei disto antes?". Por vezes ocorrem-nos ideias assim, mas não as levamos a sério, descartamo-las de imediato, e elas morrem ali. Em suma, ideias nado-morto. Assim, pode-se dizer que o primeiro obstáculo é mesmo o despertar de consciência do investigador, a responsabilidade assumida por este em supervisionar as construções produzidas pela sua mente, seja individualmente, ou em grupo. Com um pouco de sorte e trabalho poderemos produzir uma ideia com potencial.
Um segundo obstáculo coloca-se a partir do momento em que consideramos a possibilidade de explorar uma ideia. Questões como "Estarei à altura?", "Como é que arranjarei tempo para me dedicar a isto?", e "Onde vou arranjar o dinheiro?" surgem imediatamente. Infelizmente, na maioria das vezes as dúvidas prevalecem, ou optamos por não assumir mais responsabilidades, acabando por deixar a ideia órfã.
Nos casos em que decidimos avançar, entramos num comboio de dificuldades mas também num ciclo de aprendizagem. Não é aconselhável percorrer este caminho a sós. Devemo-nos rodear de pessoas que consideramos competentes nas áreas necessárias e que sejam da nossa confiança. As valências de cada empreendedor irão ser necessárias ao conjunto. Uma equipa com personalidades heterogéneas, desde que positivas, também ajuda. O ânimo e a confiança não é sempre o mesmo, e precisamos da preponderância de uns e do optimismo de outros.
Podemos considerar as seguintes fases que uma start-up enfrenta: 1) validação; 2) plano de negócios e financiamento; 3) implementação; 4) ida para o mercado. Durante a primeira fase devemos validar a ideia de forma rigorosa, geralmente através de um protótipo. Só com a certeza de que a ideia é concretizável é que faz sentido continuarmos. Na segunda fase devemos dedicar bastantes horas a trabalhar a ideia, tentando perceber como esta se distingue das demais, se vai de encontro ao que o mercado necessita, que segmentos o compõe. Tipicamente alguém que não esteja habituado a realizar planos de negócio poderá sentir algumas dificuldades a fazer um planeamento financeiro, a trabalhar estimativas, ou orçamentos. Será mais fácil para quem já teve a experiência de preparar propostas a projectos FCT, QREN, ou projectos Europeus. Na dúvida deveremos procurar auxílio na elaboração do plano de negócios. Na maioria dos casos, vamos precisar de recorrer a incentivos do estado ou a investidores para financiar a implementação da ideia. Idealmente deveremos iniciar este esforço logo no início da segunda fase, mas em certos casos, os investidores poderão exigir um plano de negócios concluído.
A terceira fase pode ser iniciada com o ânimo da certeza de termos obtido o financiamento necessário, ou com a esperança que isso venha a acontecer. Como é evidente, o primeiro caso tem um impacto muito positivo na motivação. Nesta fase, deveremos tentar gerir a implementação com algum rigor, utilizando ferramentas como o MS Project. Convém ter algum cuidado em não deixar que o tempo que dedicamos ao projecto seja absorvido em demasia por tarefas de gestão, e menos em tarefas directamente relacionadas com a I&D. Se não tivermos já experiência prévia de coordenação de projectos e equipas, esta fase poderá infligir algumas dores de crescimento, mas a vontade de aprender e o bom senso poderão ser muito úteis. Entre os perigos a evitar poder-se-á destacar: 1) gastar mais do que podemos; 2) perder de vista os objectivos e a gestão do projecto; 3) equipa desmotivada; 4) querer fazer demasiadas coisas ao mesmo tempo e não fazer nenhuma em condições. É importante focarmos num conjunto de objectivos e sermos pragmáticos.
A quarta fase é a prova de fogo. Deve ser antecedida de planeamento estratégico, estabelecimento de parcerias e de um bom plano de Marketing. Se fizemos bem o trabalho de casa, estaremos a tentar vender o produto/serviço certo às pessoas certas na altura certa e o sucesso será uma consequência natural. Caso contrário, teremos que proceder a ajustes. Na prática teremos sempre que os fazer, porque estar no mercado é um processo iterativo de adaptação à oferta e à procura.
Seja qual for o resultado do projecto, não deveremos ser demasiado duros connosco próprios. Afinal de contas estatisticamente apenas 10% das start-ups é que são bem sucedidas. Esta estatística deve-se ao alto risco e arrojo que caracterizam este tipo de iniciativas. A garantia é que a experiência será de grande aprendizagem, amadurecimento, permitir-nos-á ter uma visão diferente das coisas e adquirir mais confiança nas nossas capacidades. Boa sorte!
* Colaborador da Unidade de Telecomunicações e Multimédia