O RETORNO INESPERADO DA LUCIDEZ
Realizam-se periodicamente Cafés de Ciência que reúnem, na Assembleia da República, deputados e cientistas. O generoso da ideia é o de promover um debate esclarecido sobre temas que poderão enriquecer a capacidade de decisão que os representantes do povo precisam de exercer.
O último Café de Ciência reuniu-se sob o mote do Bosão de Higgs. Iria a sessão converter-se numa aula de Física? O perigo rapidamente ficou afastado. Quase nada se falou sobre o enigma, mas muito se debateu sobre a organização que construiu a máquina mais complexa jamais concebida pela humanidade. O papel do CERN recebeu elogios gerais, o tiro de partida dado pela Secretária de Estado da Ciência Dra. Leonor Parreira com um elogio preciso à combinação de estratégia e assunção de risco por um organismo plurinacional, como método para a obtenção de resultados.
Nada mais oportuno. No momento em que alguns talibãs defendem que é necessário retirar capacidade de decisão estratégica às instituições do Sistema Científico e Técnico Nacional, gerou-se ali um inesperado consenso entre governantes, cientistas, industriais e deputados presentes – de que sem instituições não há estratégia e sem estratégia há apenas ruído sem viabilidade de produção de impactos.
Foi um momento de fiat lux, foi uma vivência instantânea de sanidade num contexto em que, ao sabor da confusão e pânico que a crise gera, uns poucos proferem dislates com a segurança de verdades escritas na pedra. Confiam por certo que passará desapercebida, no rumor da turbulência, a sua condição de coveiros do que arduamente foi adquirido em 20 anos: a capacidade de gestão da ciência.
E toda a lucidez é precisa, em tempos de tormenta e de improviso.
Créditos foto: National Geographic