A Vós a Razão
Transiciones
Por Kelwin Fernandes*
Quando fui convidado para participar na coluna “A Vós a Razão” do BIP, o meu primeiro problema nem era o que ia escrever, quem me conhece sabe que posso falar muito, mesmo quando não tenho “a razão”. O meu maior problema era como iria conseguir escrever com apenas dois anos em Portugal já que o meu “Portuñol” se encontra no seu melhor momento de forma, visto que já não consigo falar corretamente espanhol e muito menos português (se o texto estiver muito “direitinho”, ou seja, bem escrito e sem muitos erros gramaticais, foi a equipa do Serviço de Comunicação que fez um grande trabalho, obrigado!).
Como é o INESC TEC para alguém que vem de fora? Nascido e criado na Venezuela, mas sempre “numa casa portuguesa com certeza” onde não faltava ora o bolo do caco, ora o milho frito, ora a aletria, Portugal foi a primeira opção quando decidi emigrar. Vindo de um país onde o ordenado mínimo não ultrapassa aos 15€/mês, onde os assaltos se contam por números e não por nomes e onde conseguir frango e papel higiénico é mais difícil do que conseguir emprego, as condições em Portugal, mesmo com a crise, parecem um paraíso.
Cheguei a Portugal no dia 4 de julho de 2013 e comecei no dia seguinte a trabalhar no INESC TEC no projeto SARA. Logo, depois de obter uma bolsa da FCT iniciei o meu doutoramento com a supervisão do Professor Jaime S. Cardoso, em parceria com o Hospital Universitario de Caracas, Venezuela. Neste último ano tive também a oportunidade de colaborar na organização da escola de verão VISUM, com a ajuda dos meus colegas do INESC TEC e INEB. Finalmente, nas últimas semanas, iniciei em conjunto com os Professores Jaime S. Cardoso e Luís Teixeira e do meu colega compatriota, Eduardo Marques, a criação do laboratório VILab, na FEUP, com a missão de ajudar os alunos do primeiro e segundo ciclo a participar em competições internacionais de Computer Vision e Machine Intelligence. O INESC TEC tem sido assim um espaço muito dinâmico onde tem havido sempre mais alguma coisa para fazer. Por enquanto só posso dizer: obrigado! Com a ajuda da equipa do VCMI e das restantes pessoas do INESC TEC, a transição tem sido mais do que positiva, quer a nível profissional, quer a nível pessoal.
Mas como há sempre coisas a melhorar, aproveito a oportunidade, e o tempo de antena, para dar duas sugestões que acredito que podem melhorar a dinâmica do nosso INESC TEC com o exterior. A primeira é criar uma iniciativa para melhorar a divulgação dos projetos que são desenvolvidos no INESC TEC, desde teses de Mestrado e Doutoramento até Projetos Europeus e pessoais dos colaboradores envolvidos. Neste sentido, a criação de uma plataforma para a divulgação de projetos, num conceito de portefólio, poderia, a meu ver, melhorar a imagem do INESC TEC. Esta plataforma iria permitir não só descrever os projetos, mas também disponibilizar o código e bases de dados usadas, entre outros, para desta forma promover uma investigação muito mais replicável. Também poderia haver a possibilidade de referenciar os investigadores e parceiros envolvidos, assim como também artigos publicados e outros projetos relacionados. A visibilidade desta iniciativa poderia ajudar na angariação de novos projetos e clientes. Mais ainda, e mais importante, poderia fortalecer a imagem do INESC TEC como uma instituição de referência, mostrando os trabalhos que tem desenvolvido.
A segunda sugestão diz respeito à renovação dos esquemas de interface indústria-academia. O ecossistema de empreendedorismo em Portugal tem vindo a crescer, quer por causa das dificuldades económicas do país, quer por ser uma tendência global, mas o certo é que o esquema de startups chegou a Portugal e está para ficar. Neste sentido, temos de criar formas de trabalho dentro do INESC TEC que sejam compatíveis com esta nova forma de criação de produtos, onde o espaço temporal de desenho e validação de uma ideia/protótipo é muito curto. A minha segunda sugestão reside na forma de pensarmos não só na interface entre a academia e a indústria mais madura, mas ir mais além e pensar nas novas iniciativas de negócio, onde o risco e a inexperiência dos seus agentes fazem parte vital do jogo. Mesas de mindstorming onde os novos empresários possam falar diretamente com investigadores seniores, e mais novos também, dinâmicas de trabalho que favoreçam a criação de microprojectos a serem desenvolvidos por colaboradores que já se encontram envolvidos noutros projetos, poderiam funcionar como os primeiros passos para essa transformação.
*Colaborador do Centro de Telecomunicações e Multimédia (CTM)