BANALIZAR O IMPOSSÍVEL
Sem excessivo festival, terminou o concurso denominado “as sete maravilhas de origem portuguesa no mundo”. Pro memoria, aqui ficam os resultados que foram divulgados sobre a votação popular na internet:
- fortaleza de Diu, na Índia
- fortaleza de Mazagão, em Marrocos
- basílica do Bom Jesus em Goa, Índia
- Cidade Velha de Santiago, Cabo Verde
- igreja de São Paulo em Macau, China
- convento de São Francisco de Assis da Penitência em Ouro Preto, Brasil
- convento de São Francisco e Ordem Terceira em Salvador, Brasil
São escolhas magníficas. E se acaso alguns publicitaram um público desprezo pelo conceito, não nos ocorre melhor que reflectir que uma das chagas do salazarismo terá sido essa, provocar numa camada da população a rejeição do respeito pela própria história, dado o abuso que dela fez.
Mas não nos iludamos: quem não respeita as suas raízes, dificilmente ficará de pé, pois não tem alicerces.
Convém, porém, ser mais do que contemplativo. O monumento que nos fascina, é preciso que conste, nomeado mas não eleito porventura pela sua localização mais que remota e desviada das rotas do turismo e do comentário, é o Forte do Príncipe da Beira, na Rondónia, fronteira com a Bolívia.
Descomunal: 1 quilómetro de perímetro, muralhas de 60 metros de elevação. Improvável: no meio da selva amazónica, na margem do rio Guaporé, ainda hoje para chegar lá é preciso querer ir lá. Trágico: das mortes na construção a lugar de degredo de condenados sem esperança. E épico: levantado no século XVIII, mais tarde perdido e abandonado e redescoberto pelo General Rondon em 1906, imagine-se o espanto do dar de caras com tal gargântua construção.
Acima de tudo, o Forte do Príncipe da Beira pode simbolizar, se assim o quisermos, a demência iluminada do delírio sem medida. Mas se os portugueses são capazes, hoje como em 900 anos, do melhor e do pior, escolhamos então o Forte como uma materialização do seu melhor: a ambição de ser mais, ir mais além, não aceitar limites, preferir o glorioso ao rentável e seguro, assumir o rasgo ousado de banalizar o impossível.
Assim queiramos ser. Ninguém é melhor que nós nisto que somos.