Aprender a ler, avaliar a leitura
O pior inimigo do progresso de Portugal é a ignorância. Ganha (embora seja um combate sem fim) a batalha da alfabetização linguística, falta ainda ganhar a batalha da alfabetização em gestão e administração. Evidentemente, esta afirmação não deve ser tomada como menosprezo de agentes ou organizações, mas como metáfora.
Um analfabeto não consegue ler, um analfabeto funcional não sabe ler. Daí, a problemas complexos, o analfabeto oferece respostas básicas, e ao que desconhece oferece apenas as respostas que conhece.
O caso do CCP, o famoso (ou famigerado, depende da ótica) Código dos Contratos Públicos, é paradigmático. Foi idealizado como instrumento de transparência e respeito pelas regras da concorrência, mas foi concebido como fato de tamanho único para qualquer serviço ou setor de atividade.
Que a comunidade científica tem insistentemente tentado expor que essa roupagem não serve à atividade de I&D, é um facto doloroso só comparável em dor ao insucesso iterado da passagem da mensagem em certos setores nacionais. Houve quem o entendesse – e novamente tropeçamos no nome de Mariano Gago, porque será? – mas, depois, colidimos com quem não soubesse ler e voltasse a tentar enfiar um pescoço 41 em camisa 37. Resultado, a asfixia – metáfora com trágico aroma de realidade.
Agora que sopram novos ventos de literacia nesta matéria, que se saúdam, impõe-se um desafio ao Governo de Portugal: não caberia fazer uma profunda avaliação à realidade e consequências do CCP? Não apenas sob o ponto de vista jurídico, que é o que tem prevalecido, mas do ponto de vista das consequências e resultados: económicos (que custos acrescidos está a gerar?) e sociais (que fenómenos perversos está a originar, inclusivamente contrariando o espírito generoso original?).
Pior do que implantar um sistema, bom ou mau, é não o avaliar, e acreditar que é perfeito.