As línguas mortas já foram vivas, um dia
Comunicar é evoluir.
A capacidade de comunicação em banda larga dos humanos foi fator determinante na progressão deles na senda da inteligência. A ferramenta vocal versátil permitiu que um cérebro em transformação a cooptasse para a fazer evoluir, tão verdade como ter sido a evolução do cérebro estimulada pela própria amplitude da comunicação.
As instituições, em particular as de ciência, têm que comunicar, e por diferentes motivos.
Precisam de prestar contas à sociedade do uso que dão ao dinheiro público que lhes é entregue.
Precisam de construir imagem de seriedade, de progresso, de posicionamento social.
Precisam de exibir forças e capacidades.
Precisam de entusiasmar, galvanizar, mobilizar, motivar jovens para uma dedicação à ciência.
Precisam de promover autoestima individual e social a partir dos triunfos relatados.
Precisam de ser e ter voz crítica na construção da cultura científica.
Desde 2000, o Boletim do INESC TEC, carinhosamente designado como BIP, procurou ser um pouco disso tudo – em português e inglês. As análises estatísticas, os rastreios de acessos, vieram demonstrando essa capacidade de penetração nacional e internacional. Milhares de acessos mensais, de todos os cantos do planeta, são a evidência básica dessa realidade progressivamente construída: o BIP, caracteristicamente misto de referência e irreverência, transformou-se no respeitado instrumento de comunicação de uma instituição também progressivamente respeitada.
Editorialmente independente, por opção assumida, abrindo territórios de expressão inabituais em boletins institucionais, o modelo BIP conquistou o seu espaço e marcou duas décadas.
Longe vai o tempo em que se exclamava contidamente, pelos corredores do INESC TEC: o BIP é lido em Lisboa!... Interessante, contrastar esse espanto provinciano primordial com a afirmação, um par de anos mais tarde, em tom de trivialidade: o BIP é lido na Mongólia...
A afirmação do BIP, levando o INESC TEC consigo, virou planetária, mas o planeta roda em volta do Sol e este da Galáxia e, entretanto, a vida dá muitas voltas. Novas formas tecnológicas de comunicação emergem e a vontade de experimentá-las não deverá ser reprimida. O BIP tal como o conhecemos terá, pois, um fim, cerca dos 20 anos de idade – na boa companhia, em esperança de vida, do castor, do pardal e do monstro de gila.
Este boletim, que o leitor ainda abraça com o olhar, está quase a ter o seu momento de metamorfose, deixar de ser o que é para dar lugar a uma voz sucessora, que falará a mesma linguagem ainda que não a mesma língua.
O latim é uma língua morta – mas quem negará o seu papel relevante na formatação da comunicação mundial, através das línguas suas herdeiras? Assim seja após o fim do BIP.
Algo de novo virá aí, um modelo novo, um descendente, um filho, após o BIP com que convivemos por orgulhosos anos. Fica a sensação de missão cumprida, um sentimento de perda e uma certa nostalgia.